terça-feira, outubro 10, 2006

Opinião possessiva.


Já falei bastante aqui de mudanças, de impressões, de perturbações íntimas e sugestões de sentimentos conflituosos. Já desabafei sobre o que não gosto, sobre o que odeio, sobre o que não sei, e sobre o que gostaria tanto de entender. Já falei sobre muita coisa. E Muitos dos assuntos abordados dizem respeito a mim. Disso eu sei falar perfeitamente bem. De mim. Também sei que consigo falar razoavelmente bem sobre as coisas ao meu redor. Mas muito disso tem tantos dedos meus, que, mesmo sendo sobre algo externo, é como se estivesse vendo meu reflexo em tudo que me cerca. A tarefa de quem escreve, por mais que seja um exercício de observação do que está fora, reveste-se camufladamente de uma visão egoísta do que o autor vê do mundo. Portanto, ao tentar descrever as minhas impressões sobre uma simples viagem de ônibus, é impossível para mim desvincular disso tudo a maneira como EU enxergo certos detalhes, com isenção do que estes detalhes realmente representam. Nem tudo que eu digo ou que penso é a verdade. Mas também não é falso. Não é. É, simplesmente, minha opinião sobre o fato. Minha visão. Notem o possessivo. Minha. Daí a conclusão de que toda opinião é egoísta, por mais que sua finalidade seja em prol da coletividade, por mais que sua finalidade seja de compartilhar uma idéia. Opinião é uma espécie de manifestação de auto-congratulação. É um amostramento cínico revestido de argumento.
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Mas minha intenção ao vir neste espaço hoje, além de uma mera manifestação egoísta de mostrar apenas o que vejo ou sinto, é a de dividir opinião. Por mais individual que ela seja, ela apenas deixa de só isso ser justamente na hora em que é lida. Com a leitura do outro, minha ação presunçosa de emitir minha opinião se socializa. Ela cai na interpretação de suas pupilas e de seu cérebro do modo como suas experiências lhe permitem. Mas continua sendo minha a opinião. Apenas minha. E a sua será somente a de concordar ou não. E será sua. Só sua.
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Portanto, é no mínimo interessante notar que o ato de se comunicar, por mais que envolva, no mínimo, dois sujeitos, significa a emissão e a recepção de vontades individuais. Note que muitas das conversas alheias, por maior camaradagem envolvida, sempre são revestidas de desabafos pessoais. Quando alguém chega para contar-lhe algo sobre si, o que você faz? Na mesma hora não busca um experiência parecida na SUA VIDA para contar? Uma conversa entre duas pessoas, na grande maioria (quase 99%, diz a minha experiência de observação) é nada menos do que duas pessoas falando de si, em que muitas das vezes uma praticamente nem escuta o que a outra tem a dizer; apenas procura algo a dizer.
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Na minha opinião egoísta, as pessoas deveriam prender a saber dividir mais. Inclusive seus pensamentos. Quando meu amigo chega para me dizer que viu um filme muito ruim, eu não devo como resposta pensar num filme que EU também tenha visto e tenha odiado. Eu devo, sim, tentar entender o que ele está querendo me dizer, e dar todas as oportunidades a ele de demonstrar seu ponto de vista. Afinal, aquele é um momento dele. E sabe-se lá se ele está apenas disposto a falar de si.
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Muitas vezes prejudicamos demais nossas relações quando, no momento que outro chega para dividir, passamos a substituir. Problemas da comunicação.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Quando alguém chega para contar-lhe algo sobre si, o que você faz? Na mesma hora não busca um experiência parecida na SUA VIDA para contar? Uma conversa entre duas pessoas, na grande maioria (quase 99%, diz a minha experiência de observação) é nada menos do que duas pessoas falando de si, em que muitas das vezes uma praticamente nem escuta o que a outra tem a dizer; apenas procura algo a dizer."

lembrei do meu professor de filosofia do colegio que sempre falava isso...
é a mais pura verdade...