sexta-feira, outubro 26, 2007

Coisas de lençol


- Eu só quero ver se da próxima vez você me deixará assim a ver navios...

- Você queria que fizesse o quê? Bancasse o segurança seu e de seu amigo (fazendo sinal de aspas) enquanto vocês trocavam figurinhas de como era boa a época da sorveteria de Dona Nena?

- Mas é claro. Você é meu marido e tem obrigação de me esperar!

- Minha única obrigação com você é te respeitar e te satisfazer sexualmente, Tânia, nada mais!

- Como ousa resumir nossa relação a sexo e respeito?

- E você como ousa me fazer de mero segurança de ex-namoradinho na época da Sorveteria da Dona Nena?

- Eu não te fiz nada de segurança... Eu apenas gostaria que você, como disse, respeitasse o meu momento.

- Respeito tem limite, Tânia!! Você nem me apresentou ao cabra! Nem sequer um rabo de olho em minha direção, para que eu tivesse paciência! Da próxima vez, ou você me trata como seu marido, ou eu vou te deixar esperando quantas vezes forem necessárias!!!

- Mas eu não passei nem dois minutos conversando com o Tadeu..

- Tadeu, Tadeu...porcaria de Tadeu!

- Você nunca foi de fazer essas ceninhas, não sei porque só agora..

- Não é ceninha, Tânia!!!!! Eu te deixei lá porque você, enquanto estava indo embora com seu amrido, esqueceu do mundo quando encontrou com Tadeu da época de sorveteria de DOna Nena!

-Pára de repetir "Tadeu da época da sorveteria de Dona Nena" toda hora.. O nome dele é só Tadeu!!

- Pára de falar só nesse Tadeu da sorveteria de Dona Nena, eu acho que a conversa aqui deveria se restringir a suas atitudes!

- E que tal AS SUAS atitudes???

- MInhas atitudes??? Foram as de qualquer ser humano com um pingo de 'semancol' e amor próprio, Tânia!!

- Nada disso, você demonstrou fraqueza, impulsividade e dor de corno.

- Fraqueza??? Impulsividade??? Dor de coooorno?? Essa agora é boa...

- E ainda tem mais...Eu quase que aceitava a carona do Tadeu...

- Você não ficou louca ainda não, Tânia..

- Mas eu queria te deixar louco, por ter me abandonado lá na festa!!!!!! Quebrei meu salto de 500 reais da Arezzo por sua culpa!!!! E tive que deixar o motorista do Táxi esperando lá embaixo..

- Vá logo pagar esse táxi, senão ele vai começar a desconfiar que você é mesmo uma caloteira...

- Quando eu subir, continuaremos essa conversa, mocinho.

- Se eu ainda estiver aqui, sim.

- Ouse sair deste quarto.

- Ouse mandar em mim de novo.


(Quinze minutos mais tarde. Mateus enrolado nos lençóis. Tânia se despe)


-Mateeeus, Mateeeeus.. eu não acredito que você já esteja dormindo, não..

-Huuum...

-Mateus, não me deixe mais nervosa... Desculpa...

-Huuummm...

-Da próxima vez eu te apresento...

-Huuuuuuuuummm...

-Posso entrar aí no lençol?


Mateus estende o cobertor, permitindo a passagem de Tânia.


E assim terminou mais uma discussão.

terça-feira, outubro 23, 2007

Eu sei


Hoje eu descobri algo sobre mim. Na verdade, essa frase é um exagero, pois não foi bem uma descoberta. Mas foi uma certeza de algo que eu já desconfiava há algum tempo. Nao diz respeito ao que sou ou ao que deixo de ser. Mas é sobre o que eu quero para mim no futuro.

É o seguinte: hoje ficou claro que as coisas ficam melhores quando você pratica as teorias adquiridas. Nada é mais salutar do que a sensação de ver produzido na real o que antes era imbuído da vagueza da abstração.

Hoje eu descobri que preciso ajudar o próximo. Que eu me preocupo com o bem-estar alheio, que meu negócio mesmo é contribuir socialmente. Percebi, em poucas horas, o quanto nossas diferenças explicitam na verdade o que temos de mais igual. Não vou explicar aqui qual foi a experiência que me fez reconhecer esse fato - não é de modo algum essa a intenção desse texto -, mas pretendo discorrer sobre esse importante momento em que você se olha sem miopia e sente o que realmente importa em você. É a comprovaçãode habilidades que até então você achava que tinha; é a percepção de que aquilo que era tosco e assombrado pela inexperiência é capaz de em pouco tempo brotar frondoso, pintado de novas cores, já velhas na consciência, mas originais na forma pela qual se expressam através de você.

Não sei se a atividade jurídica que tanto me enche de dúvidas ao longo desses anos de estudo sejam onde minha função nesse mundo se estabeleça confortavelmente; nem mesmo sei se através da escrita, um hábito prazeroso que me enche a alma, é o meu porto seguro da estabilidade de consciência. Mas sei, hoje eu sei, que é meu dever neste Planeta fazer dele um lugar menos sofrido de se viver.

E se esse discurso soa inexperiente, fruto de uma juventude incipiente, utópica, saiba que ele se sedimenta justamente numa maturidade estabelecida. Talvez o meu destino seja mesmo soar sempre como inocente e sonhador aos ouvidos mais impermissivos, como se eu não enxergasse as mazelas do mundo cão que se apresenta. Mas é justamente quando essas mazelas aparecem, que me percorrem os impulsos de dirimir esses males, de baixar essa febre. E não vejo outra saída que não a de estender a minha mão ao outro, seja através de minha caneta, de meu pensamento, de minha palavra ou de meu coração.

domingo, outubro 21, 2007

Eu não sei


Queria aquelas chaves de volta, pra te roubar as senhas dos cofres e acabar com a sua vida...
Mas não sei como

Queria em meu colo sua coleção de entradas de cinema, para rasgá-las com os dentes, enquanto você observasse, presa numa cadeira
Mas não sei por quê

Queria uma xícara de café quente, para derrubá-la sobre seu couro cabeludo, assim que você chegasse saltitante do cabeleireiro
Mas não consigo

Queria uma faca, ou melhor, uma tesoura, bem amolada, para enfeitar de buracos suas roupas mais caras
Mas não tenho coragem

Queria que toda vez que calçasse os sapatos, houvesse dentro um escorpião venenoso, para ferir-lhe os dedos que não mais acariciaria
Mas não sei quando

Queria que uma loucura desmedida a fizesse cair desse pedestal escroto que inventou para me coordenar, dando-lhe de presente um traumatismo e eu pudesse torturosamente lhe fazer aquelas cócegas proibidas intermináveis vezes durante o seu coma
Mas não sei quanto

Queria que tanto ódio te atingisse a nuca sempre que de longe em mim você pensasse
Mas não quero

Eu não sei várias coisas. Mas não consigo não te desejar todo mal, pois te quero tão bem...