sexta-feira, abril 29, 2011

Rejeição


É natural querer ser aceito. A aprovação faz parte de nosso extinto de sobrevivência, mexe com a capacidade de auto-aceitação, com a felicidade. Os orgulhosos dirão que preferem não se importar; os dependentes morrem por ela. De uma forma ou de outra, do desequilibrado ao centrado, não há aquele que não espere o reconhecimento.
O retorno é importante alavanca para novos atos. Requer-se feedback para todas as finalidades, do conserto dos erros, ao aperfeiçoamento dos acertos. Sejam bons ou ruins, necessitamos das borrachas, dos retoques. O humilde abraça com carinho o conselho; o boçal mal percebe a existência do outro, quanto mais de sua inócua tentativa de aconselhar.
Assim, em meio a esta já batida realidade do engrandecimento pessoal, reside no canto um fenômeno igualmente natural, porém impactante na medida exata da dor. Ser rejeitado é um nível acima da falta de reconhecimento, pois consiste na ação negativa que a omissão muitas vezes ameniza. Trata-se da resposta, da confirmação, de que não somos desejados, seja lá que desejo for. Por mais que possua uma carga subjetiva extremamente relevante, a rejeição nos dá o importante indício de que somos imperfeitos justamente naquilo que acreditávamos ser bons. Alguém não gostará de nós, apontará falhas onde não se enxergam defeitos. Alguém simplesmente não notará nossas qualidades. Alguém menosprezará a ideia de que você tem valor. Isso prejudica a autoestima, implode a confiança, apesar de muitas vezes o problema estar apenas do lado que analisa, muitas vezes de forma superficial.
É importante perceber que a rejeição cicatriza. E, consequentemente, fortalece. Por sermos passíveis de desaprovação, urge aprender a lidar com ela; trará mais conforto do que incômodo. Somos apenas projeções e sombras do modo que enxergamos a nós mesmos. Estas imagens, por sua vez, provocam os mais variados efeitos, a depender do olhar que as enxerga. E não serão os reprovadores aqueles determinantes. É preciso força para aceitar-se menor sob o olhar crítico de alguém; e coragem para reconhecer-se grande sob o nosso próprio. Os pesos são aqueles que escolhemos carregar pelo caminho. E a balança reside em nossos próprios braços.

terça-feira, abril 12, 2011

Nuvem


A proximidade distante incomoda por sedimentar a barreira do desconforto. Sou inexperiente de você, por isso desejo revelar suas reações, para aprender a prever os seus passos. No momento, você é névoa, e por tê-lo incompleto, idealizo-o, e pareço me conformar com uma ilusão do que você seja. Ao mesmo tempo, alimento meus sentimentos, entregando-lhes sobrevida a cada vez que descarto indícios de defeitos seus. A incerteza é insegura, porém curiosamente prazerosa. A aflição causada pela ignorância da sua natureza me inquieta, mas me consola. Às vezes não tenho pressa de acordar das minhas divagações, pois me falta coragem e autoestima para assumir o que você representa, e isso só prolonga a espera. Falta-me entrega. Falta-lhe clareza. Temos duas opções: confio na tua mão a guiar meus olhos vendados ou você desata o nó que tão forte prende a minha venda. E assim, teremos intimidade para dizer 'não' sem culpa; ou 'sim', com propriedade.

sábado, abril 02, 2011

Farpas



Toda farpa incomoda. Mesmo que não doa, resta a cicatriz para lembrar-lhe de algum momento de dor. São objetos não-identificados, cravados em alguma parte da alma ou corpo, a latejar a memória de um passo mal dado, ou de uma frase mal dita. Cada um resolve como lidar com elas a seu jeito: uns esperam o próprio corpo expelir o intruso, ou partem mesmo para um procedimento "cirúrgico"; outros dão tempo ao tempo para que a cura venha a conta-gotas, ou até atiram outras farpas, para ajudar a aliviar o impacto da sua própria. Não importa como se maneje a sua existência, o objetivo da farpa é se fazer notar. E uma vez lá dentro, não há como se livrar do incômodo de ter sido ferido, sem que seja bolada uma grande operação de pinças ou conversas.

A experiência vai construindo a carapaça contra as farpas, a resistência é a intenção. Com um tempo, o que no passado seria uma farpa mortal, hoje pode ser um mero sopro de vento. É de nossa natureza cultivar essas proteções, determinantes para lidar com as intromissões. Afinal, a fortaleza não reside na maneira como se lida com a dor, mas no modo como a se percebe, já que a grande maioria das farpas que nos atingem erram o alvo sem que nos demos conta. O problema é a supervalorização das que furam a segurança.

O importante é a percepção de que, no fim, farpa é apenas e exatamente o que o nome quer dizer, um "rasgão". É você quem determina se ele tem capacidade de se tornar uma cicatriz temporária, ou uma facada. Você que escolhe entre a lição e o desespero.